quinta-feira, 26 de março de 2009

Glauber Rocha, o cineasta da revolução.


Por: João Daniel Donadeli

“Arte é a mais sofisticada produção cultural de uma civilização. Cinema é a mais desenvolvida de todas as Artes”( Glauber Rocha)

Por comemoração a data em que Glauber Rocha faria setenta anos nos propusemos a comentar nas linhas que seguem um pouco da história do artista revolucionário que ao longo de sua vida destinou grande parte do seu tempo a analisar e interpretar as contradições da vida Latino Americana, palco onde desenvolveu um espírito libertário e revolucionário. A partir da arte pode expor seu pensamento e indignação com os sistemas vigentes, sendo muitas vezes perseguido e incompreendido por seus ideais. Figura polêmica e contraditória Glauber Rocha marcou sua época e deixou seguidores, seu cinema provocou a revisão da cultura brasileira idealizando uma arte independente e libertária destituída de influências externas, potencializando a própria cultura brasileira, a cultura sertanista, cultura barroca, a voz do povo, a imagem do povo, a verdade libertária ao invés da mentira alienante. Glauber fez de sua vida uma história de altos e baixos, mas uma vida vivida intensamente.
Sob o sol abençoado da Bahia aos 14 de março de 1939, Glauber de Andrade Rocha, vem ao mundo na cidade de Vitória da Conquista, Bahia. Filho de Dona Lúcia Mendes de Andrade Rocha e Adamastor Bráulio da Silva Rocha.
Alfabetizado pela mãe, aos treze anos já era crítico de cinema do programa “Cinema em Clouse-Up” na rádio da sociedade da Bahia. Depois de deixar a faculdade de direito inicia sua carreira jornalística, primeiro como repórter policial no Jornal da Bahia, e posteriormente passa a escrever artigos de cinema para o Suplemento dominical do jornal do Brasil.
Em 1957, com poucos recursos, filma O Pátio(1959), utilizando sobras de material de Redenção(1959), de Roberto Pires. O filme foi muito bem recebido por Paulo Emilio em sua primeira apresentação pública, ainda sem som, na Cinemateca em São Paulo.
Um ano depois de finalizar seu primeiro longa metragem, Barravento (1962), em pleno sertão baiano, aos 24 anos de idade, Glauber inicia as filmagens do “poderoso” Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), o filme mais aclamado do intelectual revolucionário, o filme mais glauberiano, o filme que manifesta toda a sua vivência e sua bagagem antropológica cultural carregada de dualidades, miticismo e religião, tragédia e vida, fome e vontade de comer, miséria e revolução. Neste filme Glauber articula a relação entre mito, religião e revolução, um movimento para uma desidealização do povo, (idealização aqui entendida como vontade das elites) e ao mesmo tempo para a construção de uma mitologia popular poderosa, capaz de fazer frente a um imaginário colonizado. Distante do naturalismo, Buscando as suas demandas ideológicas, e seu nacionalismo cultural, Glauber rocha, fez grande uso da metáfora, praticando um cinema de autor, inovando a cinematografia brasileira e terceiromundista.
Com esse filme, Glauber ganha visibilidade nacional e internacional além de elevar o nome do Cinema Novo.
O Cinema Novo foi um movimento intelectual cinematográfico e revolucionário que visava a descolonização da cinematografia brasileira e tinha como princípios expor a realidade latino-americana terceiromundista. Glauber Rocha mais do que qualquer um, encarou esse desafio de diagnosticar o Brasil, enfrentado os problemas “filmo - estéticos” que um discurso totalizante implicava.
Tendo o cenário político e brutal das ditaduras militares que infestaram a América Latina, Glauber escreveu e filmou Terra em Transe(1967), um filme de observação pessoal, ligado a própria realidade, sem apoio na tradição cultural brasileira, sintetizando o pensamento latino americano sufocado pelas ditaduras,” Terra em Transe é um filme sobre o que existe de grotesco, horroroso e podre na América Latina.” dizia Glauber.
O filme foi barrado e proibido pela censura federal sob a acusação de ser um filme subversivo e difamador da igreja católica, em Cannes(1967) o filme é indicado a Palma de Ouro e ganha os Prêmios Luis Buñuel, conferido pela crítica espanhola, e o da FIPRESCI - Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica, além de muitos outros prêmios por onde passou.
Em meio a muitas interrupções nas filmagens em 1968 finaliza O dragão da maldade contar o santo guerreiro, finalizando também a trilogia de Antônio das Mortes, personagem que surge em Deus e o diabo. Com o Dragão da maldade, Glauber ganha o premio de melhor diretor em Cannes 1968.
Antes de partir para o exílio Glauber a convite de um produtor europeu filma Cabezas Cortadas(1970) na Espanha, uma fusão de um delírio déspota peronista na terra do General Franco, Um ditador aprisionado em seu próprio castelo, que é sua clausura mental. Na áfrica Filma O Leão de 7 Cabeças neste trabalho o cineasta baiano demonstrou magistralmente uma tremenda sensibilidade no tratamento dos aspectos mais belos da iconografia iorubana.
Com o aumento da repressão militar, Glauber desiste de seus projetos no Brasil e parte para um exílio do qual nunca mais retornaria totalmente.
Perambulou pelo mundo, filmou em Roma, Claro 1975, filme que recebeu péssimas críticas na Europa, e pouco foi visto no Brasil. Voltou ao Brasil filmou o polemico e proibido documentário Di (1976) filmado no enterro do pintor. Mais tarde sob forte pressão da Igreja Católica, filma A Idade da Terra (1980) seu último e incompreendido filme. A idade da terra mostra a um cristo humanizado em analogia aos quatro cavaleiros do apocalipse, um filme experimental que rompia totalmente com o modelo vigente, sua riqueza simbólica e metafórica codifica a ideologia revolucionária latino-americana condicionada pela imposição e pela dominação de uma colonização cultural.
Em 1981 Glauber vai viver em Portugal na cidade de Sintra, onde se isola com a família recebendo apenas amigos mais íntimos, com a saúde abalada há alguns meses, Glauber tem como diagnóstico uma pericardite viral. Em 6 de agosto seu estado se agrava e é internado num hospital próximo a Lisboa por complicações bronco-pulmonares. Em estado de extrema gravidade é trazido de volta ao Brasil na noite do dia 20, sem acompanhamento médico ou soro. Chega ao Rio de Janeiro no dia 21 e recebe soro ainda na enfermaria do Aeroporto do Galeão, é levado para a Clínica Bambina, em Botafogo. Morre às 4 horas da manhã do dia 22 de agosto de 1981. Glauber é velado no Parque Lage, cenário de Terra em Transe, em meio a grande emoção e exaltação como pode ser visto no filme Glauber labirinto do Brasil(2003) de Silvio Tendler.
Glauber viveu num tempo em que existia o sonho de revolução, em que o sonho era o sonho de grandeza e esperança, Glauber acreditou que a revolução viria da união da arte com a política, da realidade com a utopia, em outro tempo Glauber não viveria, intelectual engajado com a política e com a arte, propunha mudanças para o Brasil e para o mundo, homem que buscava amenizar a exploração de um povo, que era o seu povo, homem que se contradizia e justificava suas contradições, falava sobre a dialética das coisas, e percebia o movimento, mas também era causador de movimentos, teve um sonho e foi protagonista desse sonho.“Não Justifico nem explico meu sonho porque ele nasce de uma intimidade cada vez maior com o tema de meus filmes, sentido natural de minha vida”.( Glauber Rocha)




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